Classificação etária: 14 anos.
Trilha Sonora:
http://www.listenonrepeat.com/watch/?v=JcjaBR8ouHY
Nós não falamos sobre Sarah.
Eu sempre quis uma irmãzinha menor. Eu ficava implorando pros meus pais. "Por favoooooooooooor" mas eles sempre olhavam pra outro lado e falavam que não era tão simples quanto eu pensava. Ainda assim eu ficava pedindo toda hora.
O dia em que eles trouxeram Sarah pra casa, foi o dia mais feliz da minha vida. Ela era tão fofa! Eu mal podia esperar pra brincar com ela! Eu comecei a mexer nos meus brinquedos, marcando quais eram meus e quais eram dela. Eu peguei a caneta do papai emprestada e fui marcando nossos nomes neles, pra que a gente não se confundisse.
Ela chorava muito no inicio. Eu perguntava porque ela chorava pros meus pais e eles falavam que era normal. Eles disseram que quando ela se acostumasse conosco e com a nova casa ela pararia de chorar tanto. Mas as vezes, ela chorava tão alto que papai tinha que levar ela pro porão que era à prova de som, pros vizinhos não reclamar.
Ela dormia no quarto da mamãe no primeiro mês. Eu tentava entrar lá com eles às vezes, mas eles sempre trancavam a porta. Mamãe falava que a cama era muito pequena pra nós quatro. Eu fui paciente, eu sabia que aquela nova cama com umas barras no meu quarto seria dela algum dia.
Quando eles sentiram que era seguro deixá-la dormir sozinha, eles colocaram ela na cama. Ela parou de chorar tanto, e eu deitava na minha cama e ficava vendo ela do outro lado do quarto. Eles a levavam pro seu quarto e ficavam com ela até ela dormir, depois traziam ela pra cama. Às vezes eu via que ela ficava lá, deitada, olhando pro teto, sem dormir, então eu ia lá e entregava um brinquedo pra ela por entre as grades, mas ela jogava os brinquedos fora e começava a chorar. Eu me escondia nas cobertas até o pai vir cuidar dela.
Depois de um tempo, eles deixaram ela ficar comigo no quarto dos brinquedos. Me disseram para não dar coisas pontiagudas, ou pequenas, para ela não se machucar. Eu estava tããããão feliz! Eu ficava escovando seu cabelo e falando que ela era a melhor irmãzinha do mundo! Eu mostrei quais brinquedos eram meus e quais eram dela, mas ela não se importava. As vezes a gente sentava perto da janela, e ela ficava batendo na janela enquanto eu desenhava nela.
A escola começou no Sugar Creek Elementary, e eu fui mas Sarah tinha que ficar. Mamãe falou que ela não estava preparada pra escola ainda. Eu chegava em casa e contava tudo que eu tinha aprendido pra ela. Eu desenhava eu e ela brincando e mostrava pro papai, que sorria e guardava eles no seu escritório.
Então chegou o dia ruim. Muito ruim. Eu nunca vou esquecer esse dia. Eu cheguei da escola e mamãe estava sentada na mesa, fumando. Ela parecia muito triste. Eu fui brincar com a Sarah, mas não conseguia encontrar ela. Eu perguntei pra mamãe onde ela estava, e mamãe começou a chorar. Eu perguntei o que tinha acontecido e mamãe falou que Sarah se foi. Eu não entendi totalmente, mas comecei a chorar e falei que nós tínhamos que encontrar ela. Ela balançou a cabeça e disse que ela tinha ido pra um lugar que não podíamos ir.
Papai desmontou a cama dela. Jogou fora todos os meus desenhos com ela. Ele apagou os nomes dos brinquedos. Às vezes eu encontrava uns que ele não tinha apagado e começava a chorar. Eu comecei a coletar e esconder eles, mas ele os encontrou por acidente e ficou muito bravo. Era como se ela nunca tivesse existido. Não era justo! Eu falei pra mamãe que o papai era besta por não nos deixar falar sobre a Sarah, mas ela falou que ele estava certo e que era melhor assim e que eu entenderia quando ficasse mais velha.
Eu vi a Sarah de novo.
Foi só uma vez, mas eu nunca vou esquecer. Eu estava passeando com mamãe. Fomos no mercado, fomos comprar tecidos pra fazer cortinas. E mamãe precisava ir no correio enviar umas cartas e comprar uns selos. Eu estava olhando os posters na parede enquanto mamãe falava com a mulher no balcão e eu vi Sarah. Ela era tão fofa quanto eu me lembrava. Eu cheguei mais perto e olhei sua foto, mas eles tinham colocado o nome dela errado. Escreveram Shannon.
Eu corri pra mamãe e puxei a ponta da manga dela, falando que a foto da Sarah tava na parede com outras fotos de crianças, mas ela ficou envergonhada e se desculpou com a mulher do balcão e me levou pra fora do correio. Eu tive que gritar por que ela não parava de falar por cima de mim:
"Eu vi Sarah! Eles estão com a foto dela lá dentro!"
Minha mãe me deu um tapa e falou que não era Sarah, e que mesmo que parecesse com ela eu estava errada e que se eu não parasse eu ia entrar em problemas com o papai quando chegasse em casa. Eu chorei e prometi ficar sem falar nada, mas mesmo assim fiquei sem jantar e tive que ficar no quarto aquela noite. Eu ouvi papai e mamãe conversando na cozinha e eles começaram a falar alto. Daí alguém começou a abrir as gavetas e armários da cozinha com raiva e papai começou a subir as escadas com passos pesados mas mamãe gritou "Nem pensar!" e ele parou bem na frente do meu quarto e desceu as escadas.
Essa é a primeira vez que falo de Sarah desde aquele dia.
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Fraca essa história? Leiam mais uma vez. Ainda está fraca? Leia mais uma vez.
Ainda fraca? Leia imaginando Sarah não como um bebê, mas sim uma criança pequena da idade da garota que conta essa estória. Depois de um tempo vou explicar essa estória, que é uma das melhores até hoje.